sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Falar sobre o inefável


Em determinado ponto do livro A Madona de Cedro, do grande Antonio Callado, o personagem Pedro Sacristão ao ouvir uma conversa que lhe faz despertar uma idéia há tempos adormecida é tomado por uma felicidade sem tamanho, algo que ele não sabe descrever, o tal do inefável. Finalmente ele se deparava com esse tal que muitos falavam, mas que – por ser inefável – ninguém sabia descrevê-lo. Na hora mesmo me deu um estalo: falar sobre o inefável neste modesto blog. Claro que no mesmo momento lembrei-me do falar sobre a falta do que falar, mas não se trata disso, nem mesmo um caminho para abordar tal assunto.

Inefável é aquilo que não pode ser descrito por palavras. O ser humano não se conforma com o inefável, pelo menos aqueles com o espírito mais inquieto. Os artistas, por exemplo. Um do labores do poeta é justamente esse; trabalhar constantemente com o inefável. Aquilo que os mortais não conseguem escrever sobre, vem o escritor e o faz, até que lemos e dizemos: É isso! É isso mesmo que eu queria dizer! Lembro-me inclusive da história de Olavo Bilac. Certa vez um homem que pretendia vender o seu sítio, encontrando com o poeta pede sua ajuda. Pediu que ele, Bilac, redigisse o anuncio para publicar no jornal. O príncipe dos poetas, então escreve: "Vende-se encantadora propriedade, onde cantam os pássaros ao amanhecer; com extenso arvoredo, cortada por cristalinas e marejantes águas de um ribeiro. A casa banhada pelo sol nascente oferece a sombra tranqüila das tardes, na varanda". Passado algum tempo, o poeta encontra o proprietário e pergunta se ele conseguiu vender o sítio, ao que esse responde: “Quando li o anúncio e percebi a maravilha que tinha desisti imediatamente de vender aquele paraíso!” Quando o homem comum não consegue o poeta o faz.

O escritor somente conhece a acepção do termo, mas duvida a todo custo de sua veracidade. Esse é o desafio constante do labor com as palavras, a constante superação, o buscar definições diferentes das que já foram impressas, publicadas. O inefável não existe, o que existe é o medo de encarar um papel e caneta ou, nos dias de hoje, uma tela de computador e um teclado para escrever sobre todos os temas que porventura se afigurem interessantes.

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